domingo, 26 de dezembro de 2010

PERCURSO DE VIDA DE UMA DOCENTE - II


No longínquo ano de 1951 e vivendo em Lisboa, surgiu a oportunidade de vir a ocupar um lugar de professora no Colégio Infante de Sagres, localizado na Gabela.
Como o meio de transporte habitual, na altura, para vencer a distância entre Lisboa e Luanda era o vapor, procurou-se e conseguiu-se lugar no "Pátria".
A viagem decorreu bem, a convivência óptima, a festa da passagem pelo Equador,  especial e o azul do mar, no Golfo da Guiné, inesquecível.
A seu tempo Luanda e, no porto, um escuteiro "fardado" a quem tinha sido confiada a missão de descortinar, entre a multidão, a tal solitária que se lhe daria a conhecer ao fazer a continência.
Uma volta pela cidade para contactar as pessoas a quem tinha sido recomendada, e, recebida depois, na casa do Escuteiro como se fosse mais um membro da Família (que saudade e como os bons costumes se perderam!...). 
No dia seguinte a caminho da Gabela. 
Um percurso longo, em camioneta "cansada", as estradas "o possível", a pernoita na Quibala, compensadora e, finalmente atingida a meta.
O Colégio construído para nele ser ministrado o ensino primário, foi melhorado para dar lugar ao ensino secundário. Mas, ao contrário do imaginado e desejado, o número de alunos a matricular, nunca foi o suficiente para poder manter o colégio. Talvez por dificuldades financeiras dos roceiros com filhos em idade de continuar estudos para além da primária. Talvez, mas o certo é que fechou.
Na terra e na região também se encontrava que fazer nas Empresas, desempenhando, por exemplo, a função de guarda-livros, hoje em dia Técnicos Oficiais de Contabilidade.
Considerando que, a minha vocação era, sempre foi, o Ensino e que me encontrava longe do sítio onde poderia obter as informações necessárias à realização deste meu objectivo, eis-me a caminho da Capital.
E foi positivo e revivi ao ser publicada em 09/03/1956 a Portaria que me colocava como Professora do 6º grupo (2º. grau) do Ensino Técnico, na Escola Industrial e Comercial de "Artur de Paiva", em Sá da Bandeira.
Para ir ocupar o lugar era dada passagem de Luanda a Sá da Bandeira ou por avião ou, quando possível, por barco - Luanda/Moçâmedes  e comboio Moçâmedes/Sá da Bandeira. No caso, teve lugar a 2ª hipótese e foi óptimo.
Permitiu-me que, ao passar pelo Lobito ficasse a gostar da localização da cidade bem junto ao mar e também agora, de comboio, tornou possível que durante a viagem passasse por terras de uma beleza tão agreste como a da Serra da Chela.
A cidade de Sá da Bandeira, à chegada, pareceu-me arejada e relativamente moderna.
A "Artur de Paiva" de reconhecido nível e aonde se ministravam os seguintes cursos:
                        
                    - Geral de Comércio
                    - Formação Feminina
                    - Carpinteiro Marceneiro
                    - Desenhador da Construção Civil
                    - Montador Electricista
                    - Serralheiro Mecânico

O ambiente de trabalho excelente assim como o relacionamento entre os colegas. Os alunos respeitadores, amigos e disciplinados que chegue.
A cidade, onde também funcionava o Liceu Nacional Diogo Cão, era denominada no meio académico a "Coimbra de Angola", porque recurso de muitos estudantes do Sul para continuar estudos além da primária.
E é ainda de referir a existência do espaçoso e bem cuidado parque da Senhora do Monte. Lá se encontravam: a Capela com a mesma designação, muito visitada pelos crentes; o canteiro com maravilhosas rosas; água a surgir em cascata e a formar lago onde se nadava ou andava de barco (“gaivotas”).
Muitos os eventos (touradas, futebol, ralis e durante 15 dias do mês de Agosto, a importante Feira Agro-Pecuária aonde até tinham lugar concursos de gado bovino proveniente do estrangeiro (Holanda, África do Sul ...).
Voltando à "Artur de Paiva".
Sempre que o Director dos Serviços, no desempenho das suas funções se deslocava às Escolas, havia reuniões em que nos era dado a conhecer alterações efectuadas ou projectadas no Ensino.
Numa dessas reuniões, deu-nos a saber que iam começar a funcionar mais Escolas em mais localidades e concretizou, "uma no Lobito".
Esta notícia trouxe-me, de imediato, à memória, a boa impressão com que fiquei da cidade,  aquando por lá passei, a caminho de Moçâmedes.
Pensando melhor, requeri transferência para a dita Escola. Foi deferida a minha petição e em Julho de 1958 apresentei-me na então Escola Comercial do Lobito onde me mantive até 31 de Agosto de 1975 (17 anos no Lobito, 24 em Angola).
De todas as terras onde vivi guardava boas recordações: do relacionamento humano, da grandeza, da beleza, do muito esforçado trabalho das gentes, mas, o Lobito tornou-se a menina dos meus olhos. Adoptei-a e senti-me adoptada.
Por natureza só sou expansiva que chegue mas lá sentia-me eu própria e, de certeza, manifestei perante os meus alunos (substitutos dos filhos que não tive) a minha sinceridade, os meus defeitos e virtudes.
Aqui, assumida solitária, aguardo a oportunidade de contactar, nem que seja só anualmente, e em dia aprazado, com os muitos e dispersos Amigos, o que tem vindo a acontecer, desde 1983.
Coisas da vida enquanto Vida.

(Professora na EICL)

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